Violência sexual contra adolescentes em Maputo

Violência sexual contra adolescentes


No âmbito do projecto ‘Maputo cidade segura livre de violência sexual’ promovido pela WLSA Moçambique, facilitei a covinte desta Organizaçao uma capacitação sobre o tema: ‘violência sexual contra a mulher’.  O evento que teve lugar  no Instituto superior Maria Mãe África (ISMMA), na cidade de Maputo, contou com cerca de 40 raparigas em idade escolar.

A capacitação que teve como base a metodologia interativa, visando a maior participação das formandas, começou por definir o termo violência sexual, como sendo qualquer acto ou tentativa de obter um acto sexual sem a vontade da vítima. Podendo ser por meio de comentários ou insinuações não desejados, dirrigidos por uma pessoa usando a coersão ou uso da forca. (OMS, 2010).

A violência sexual não implica necessariamente a penetração da vulva, ou ânus com o pênis ou outra parte do corpo ou objecto.

Seguimos para a desmistificação sobre quem é e/ou pode ser o violador? Será um indivíduo estranho? O debate atiçou com a vivacidade das participantes, algumas defendiam que os pais em situação alguma poderiam ser violadores ‘os outros pais podem ser mas o meu pai nunca… o meu pai nunca poderia violar  os meus filhos porque são netos dela’, outras entretanto, afirmaram que ‘o violador não tem cara’, na sequência houve partilha de testemunhos, contava uma rapariga ‘fui violentada pelo meu próprio irmao’. 

É importante salientar que, a violência sexual constitui um mal doloroso dadas as atrocidades sentidas pelas vítimas e é uma autêntica violação aos direitos humanos, contudo, é fundamental que se saiba que este crime, infelizmente é também cometido por pessoas próximas de nós, não se restringe somente a desconhecidos. Talvez se fosse cometido por estranhos seria mais fácil encontrar os mecanismos para a sua prevenção, porém, sabemos da literatura, dos casos que nos chegam através dos media, dos que nos chegam nos gabinetes de apoio à vitima, de situações familiares, que a violência sexual pode ser perpetrada por familiar (pai, mae, tio, primo, sobrinhos, irmão, esposo, namorado), amigo da família (Padrinho, professores, padrasto, etc), como também por indivíduos desconhecidos. Nesta perspectiva é fundamental estar atento para situações deste género, porque todos nós podemos ser vítimas e qualquer pessoa inclusive àquela a quem mais confiamos pode a dado momento se tornar violador.

Outra questão que foi levantada tem a ver com a violência pelo parceiro íntimo, se pode a mulher apresentar a queixa da violência sexual cometida pelo seu companheiro?, ‘vão querer o dinheiro de lobolo  de volta… se a família não te apoia não tem como avançar com a queixa’. 

Na realidade esta questão inquieta muitas pessoas, ao mesmo tempo que silencia muitas vítimas. Existem muitas opiniões que condenam as mulheres que sofrem a violência sexual pelo parceiro, algumas descredibilizam a narrativa da vítima. Estas opiniões condenatórias têm o seu fundamento na tradição e nas desigualdades do género (deveres que se pressupõe serem da incumbência da mulher numa relação). Cavalcanti (2008). Facto que perpetua que a mulher sofra calada, e que os agressores continuem impunes e cada vez mais a fazer vítimas.

Assim, reforçámos a ideia de que independentemente da relação que se tem com o violador, do cargo/estatuto social que ocupa, do apoio familiar, das ameaças, toda a situaçãao de crime deve ser denunciada às autoridades. Reforçámos que no caso de o violador ser um agente da polícia ou outra autoridade, como algumas raparigas referiram, temos de recorrer a outras instâncias, Associações, organizações da sociedade civil, capazes de dar seguimento ao nosso processo. 

Relativamente às causas da violência sexual foi explicado que não existe uma causa que justifique este crime, porém, pesquisas mostram que o uso de estupifacientes (drogas, bebidas alcoolicas) constitui um meio condutor para o agravamento da prática. Encontramos ainda questões ligadas à tradição, obscurantismo (a prática sexual com menores cura doenças como o HIV nos homens mais velhos).

Alguns, na tentativa de culpabilizar a vítima, invocam questões ligadas ao tipo de vestuário feminimo, ‘ou porque e curto, transparente, desenha o corpo da mulher e o homem acaba por violar a menina’. Fazem este tipo de comentários para culpabilizar a vítima e consequentemente responsabilizá-la pelo crime que sofreu. A verdade é que nenhum tipo de veste ou outra tentativa de argumentação deve ser usado para justificar a violação dos direitos humanos. Qualquer tentativa ou acto deve ser denunciada porque as consequências são graves e comprometem a saúde, o bem-estar e os direitos da vítima.

Para as adolescentes ou qualquer mulher, chamamos a atenção de alerta para que situações de violações não passem despercebidas.

É essencial que a mulher conheça o seu corpo, saber delimitar em si mesma as partes públicas, aquelas que qualquer pessoa pode ver ou tocar e não nos cria qualquer constragemento. E partes privadas, aquelas em que somente nós podemos tocar, na intimidade. Algumas situções do desconforto são notáveis quando alguém nos abraça ou toca em parte do nosso corpo que consideramos ser íntima a nós, ou algum tipo de conversa que nos cria desconforto. Estes podem ser alguns dos sinais de alerta de violência sexual.

Em termos mais notáveis das consequências deste mal, destacamos: 

Mudança radial do comportamento;

Medo excessiva de ficar sozinha (ou na companhia de uma certa pessoa);

Agressividade espontânea;

Lesões nas zonas genitais;

Infecções sexualmente transmisséíveis, como o HIV;

Gravidez indesejada;

Depressão, isolamento, culpa;

Frequência irregular às aulas, faltas ou assiduidade/pontualidade excessiva (dependendo da relação com o agressor: familiar, professor, alguém do caminho para escola/casa);

Dificuldades de concentração e aprendizagem;

Baixo aproveitamento escolar;

Difuculdades no relacionamento interpessoal;

Negação do contacto fisico (não gosto que me toquem).

Terminámos a capacitação discutindo da violência sexual na rua por indivíduos desconhecidos e mecanismos de prevençãao a adoptar. Um dos aspectos que foi arrolado tem a ver com a solidariedade feminina, "Muitas das crianças e dos adolescentes que convivem com a situações de vilência doméstica buscam referências fora do ambiente familiar" (Silva & Capmos, 2008: 95). Nesta perspectiva, as mulheres devem se unir, serem empáticas umas com as outras, saber ouvir a opinião da outra sem julgamentos mesmo que não concorde, ajudarmo-nos umas às outras para em conjunto erradicarmos este crime. Sabemos que este crime pode acontecer com qualquer pessoa e em qualquer lugar, chamamos atenção para as alunas do curso noturno:

Evitar andar em lugares mal iluminados

De noite andar sempre acompanhada ou em grupos;

Evitar responder a pedidos de estranhos a noite quando estiver sozinha;

Usar sempre caminhos iluminados e espaçosos;

Denunciar sempre violações de que tenha conhecimento, fornecendo todos os dados possíveis para ajudar na investigação e no policiamento;

Comunicar tentativas a alguem de confiança;

Ser atenta para ajudar as colegas caso precisem

Não julgar, ou fazer comentários desdenhosos a colega. 


Bibliografia

Organização Mundial da Saúde (OMS) (2010). Prevenção da violência sexual e da violencia pelo parceiro íntimo: ação e produção de evidência. 

Cavalcanti, Ludmila Fontenele (coord.) (2008). Prevenção da violência sexual coontra a mulher. 2.ed. Núcleo de Saúde Reprodutiva e Trabalho Feminino da Escola de Serviço Social da UFRJ.

 Silva, Ana Paula Queiroz da & Campos, Herculano Ricardo (org.) (2008). Estratégias de enfrentamento à violência contra crianças e adolescentes na ciadade Natal(RN). Núcleo de Estudos e Pesquisas do CEDECA Casa Renascer/RN.


Elaborou o relatório Júlia da Regina Sainda

Maputo, 06, de Março de 2019.

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